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Revista do Villa

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Petrópolis Hotel: o retrato do ocaso de uma região

O Petrópolis Hotel no ano de sua inauguração. 1924. Almanak Laemmert. Foto autor não identificado. Acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro

O Petrópolis Hotel foi inaugurado formalmente no dia 15 de agosto de 1923. Sua entrada era pela rua Frei Caneca, número 92. Os seus 60 quartos, em sua maioria com a frente voltada para a então chamada rua do Areal, atual rua Moncorvo Filho, possuíam água corrente, telefones e eram finamente mobiliados. No primeiro andar, existia um restaurante-café, com uma bomboniére, de onde se embarcava no elevador que servia os 3 andares do prédio e seu terraço. Este contava com um bar e um espaço para festas. De lá, o hóspede podia aproveitar uma boa vista da Cidade Maravilhosa da década de 1920.

A rua do Areal em direção ao Campo de Santana. 1924. Revista da Semana. Foto autor desconhecido. Acervo BNRJ

Para a época, era uma boa localização. Ficava perto da Praça da República, em sua antiga configuração, sem o corte da futura avenida Presidente Vargas e da estação ferroviária da Central do Brasil. Era servido por várias linhas de bondes que faziam ponto nas imediações. Tinha como vizinho o recreativo Luzitano Club, da rua Frei Caneca, com suas vesperais dançantes, animadas por jazz-bands

A rua do Areal no ângulo oposto. Ao fundo o hotel Petrópolis. 1924. Revista da Semana. Foto autor desconhecido. Acervo BNRJ

Na mesma rua, na esquina oposta, da rua do Areal com a Praça da República, estava o casarão do Conde dos Arcos, antigo prédio do senado imperial e da República Velha, que funcionou ali até dezembro de 1924, depois, no ano seguinte, foi transferido para o Palácio Monroe.

O Palácio do Conde dos Arcos e senado da República. 1919. Almanak Eu sei tudo. Foto de autor desconhecido. Com modificação. Acervo BNRJ

Hermeto Lima, erudito e historiador, deixou memória escrita sobre a antiga rua do Areal. Antes, era rua das Bôas Pernas, assim chamada pela dificuldade de transpor a via coberta por areia. Depois, foi renomeada Barão de Paranapiacaba, mas o nome não vingou. A rua ganhou seu nome definido por ordem do prefeito Carlos Sampaio, em 1921, em homenagem ao pediatra Moncorvo Filho, fundador da Assistência à Infância do Rio de Janeiro, que funcionava quase em frente ao hotel.

O Dr. Moncorvo Filho. 1922. Jornal O Social. Foto de autor desconhecido. Acervo BNRJ

Em fevereiro de 1923, o prédio estava à venda, anunciado pelo antigo dono como “acabado de construir” e “próprio para hotel ou pensão". Tinha originalmente 48 quartos, 4 lojas térreas. A sociedade no hotel foi constituída pelos sócios Manoel de Almeida e o capitão Manoel Quintella, que já era do ramo, firma registrada para “comércio de aposentos mobiliados”, sob a firma Almeida & Quintella, com capital de Rs 80:000$000 - oitenta contos de réis. Funcionou em “soft opening” desde junho de 1923 até agosto.

Vista aérea do Rio. Em destaque o Campo de Santana e em vermelho o Hotel Petrópolis. 1938. Sem autor. Acervo Museu Aeroespacial. Guarda Brasiliana Fotografica

Durante algum tempo, foi ponto de comemorações, réveillons e, lógico, bailes carnavalescos. A festa de Momo de 1924 foi organizada com a construção de vários coretos ornamentados em frente ao prédio do hotel, baile à fantasia no terraço e uma batalha de confete desde o Campo de Santana até a Avenida Mem de Sá. Uma comissão julgadora, composta por membros da imprensa, dava notas para os foliões e para o desfile de automóveis.

Batalha de Confete na praça 11 de junho. 1922. O Malho. Foto autor desconhecido. Acervo BNRJ

Apesar de ser descrito como “elegante”, era um hotel com preços módicos e não tinha condições de competir com os grandes estabelecimentos do centro, como o Avenida, na Avenida Rio Branco. Além disso, a construção de opções de luxo, como o Glória, inaugurado em 1922, ou o grande Copacabana Palace, em 1923, apontavam para uma nova configuração do setor hoteleiro do Rio de Janeiro.

O Hotel Avenida. c 1920. Coleção Gilberto Ferrez. Foto Augusto Malta. Custódia Inst. Moreira Salles

A degradação foi rápida. Certamente as lojas térreas não pertenciam aos sócios. Já em 1924, Abílio Vieira & Companhia abriram uma fábrica de caixotes no mesmo endereço, serrando, martelando e acabando com o sossego dos hóspedes.

Revista Vida Carioca. 1924. Foto de autor desconhecido. Acervo BNRJ

Os problemas maiores começaram no final da década de 1920: penhoras de bens para pagamento de impostos e títulos protestados. O hotel passou a se chamar “Rio Petrópolis”, em 1926. Em 1929, o vizinho Luzitano Club fecha as portas. Um novo dono, Manoel A. Affonso, é notificado por infração de posturas municipais: o elevador do prédio estava “funcionando em desacordo com a lei”.

 

Em 1938, veio o golpe final. O então primeiro delegado auxiliar da capital, Dr. Frota Aguiar, enviou um ofício ao chefe de polícia, o sinistro Filinto Muller, pedindo o fechamento de vários hotéis do Rio de Janeiro, por irregularidades, pois estavam funcionando com finalidade diferente do que estava previsto nas suas licenças. Dentre eles, o Rio Petrópolis. Para piorar, os gerentes do negócio foram acusados de facilitação da “prática de lenocínio” - exploração ou facilitação da prostituição.

O chefe de polícia da capital. Filinto Muller. 1934. Revista Criminal. Foto de autor desconhecido. Acervo BNRJ
O delegado Auxiliar Frota Aguiar. 1934. Revista Criminal. Foto de autor desconhecido. Acervo BNRJ

Algumas reaberturas, melancólicas, foram tentadas. Com outros nomes, o ponto acomodou, em 1941, o Panamá Hotel, “rigorosamente familiar”, oferecendo “salas e quartos” para aluguel. Em 1947, o prédio passou por reformas e o negócio de hotelaria reabriu sob o nome de Rio Negro. O estabelecimento foi comprado por evangélicos e oferecia descontos para pastores, em 1951. Com o mesmo nome, mudou de dono várias vezes, mas nunca perdeu a fama de “barra pesada”. Em 1958, uma gangue de ladrões paulistas, sob o comando do vulgo “Promessinha", foi presa no local. No final da década de 1960 foi comprado por espanhóis, agora renomeado de Hotel Guisande. Foi fechado no mesmo ano, sob a velha alegação de local de favorecimento à prostituição.

Aspecto atual. Fachada da esquina de rua Frei Caneca com Moncorvo Filho. Fotos do autor

Hoje o prédio é residencial, descaracterizado e em péssimo estado de conservação. Quase um “estudo de caso”, o ponto sofreu com a franca decadência da zona central da cidade, com o deslocamento dos atrativos turísticos, com a mudança daquilo que se costumava chamar de “sala de visitas do Brasil”, definitivamente de malas prontas para a zona sul do Rio e suas praias.

Aspecto atual. Fachada da rua Moncorvo Filho. Fotos do autor
Aspecto atual.Entrada da rua Frei Caneca. Fotos do autor
Aspecto atual. Fachada da esquina de rua Frei Caneca Imagem Google Maps

Após anos de negligência, foi assinada a lei complementar número 229 de 2021 que instituiu o programa “Reviver Centro”, da prefeitura do Rio de Janeiro. O projeto tem a intenção de recuperar a zona central da cidade. Logrou êxito em alguns eixos viários do centro, com a reconfiguração do porto, retrofit predial, ressignificação de velhos edifícios e a construção de novas unidades habitacionais. No ano de 2024, foi anunciada uma grande revitalização do Sambódromo e a derrubada do elevado 31 de março, quase vizinhos do antigo hotel Petrópolis. Que as obras tragam dias melhores para a região. 

 

*BNRJ - Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

 


 

Flavio Santos


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