O texto é de Renato Carrera, que aborda o assédio moral e sexual na sociedade contemporânea e dentro da igreja católica. Assunto extremamente pertinente e contemporâneo, e válido ao ser tratado num palco de teatro. Até mesmo porque, em momento recente, gerou demissão de ministro acusado de assédio. O tema é sério, mas é adaptado para uma linguagem teatral.
O texto é forte, sério, denso, engajado, denunciador, é um grito de alerta contra um ato que atinge a dignidade da pessoa humana, os direitos fundamentais e a moral da vítima.
Assim, o assédio, seja qual tipo for, é considerado crime. Algo horrível!
O personagem Otávio é um jovem religioso, funcionário dos Correios e filho de uma mãe dominadora, que tem sua fé abalada por conflitos sexuais e morais ocorridos dentro da igreja que frequenta.
Ele decide fazer justiça com as próprias mãos e, assim, modificar sua vida para sempre. Tal atitude vai deixar sequelas. Portanto, a narrativa se processa a partir da mente conturbada desse homem que sofreu assédio.
Da mesma forma, que Otávio realizou justiça com as suas próprias mãos, há tantas outras que se silenciam, e sofrem caladas. Ao procederem dessa forma, acabam deixando os agressores, porque o assédio é uma agressão, sem punição e com espaço aberto para outras ações criminosas. A peça também denuncia esse silencio.
O elenco é constituído por quatro atores: Renato Carrera, Dani Ornellas, José Karini e Hugo Germano. No geral, eles apresentam uma boa atuação. Dominam o palco e o texto. Tem uma movimentação intensa, que ocorre dentro de um espaço delimitado por um círculo branco. A linguagem do texto é simples, embora sua narrativa não seja de fácil compreensão, o que dificulta uma melhor comunicação dos atores com o público. Apresentam boas interpretações dos respectivos personagens, contudo um aprofundamentamento de expressões emotivas precisam ser mais realizadas. O assédio maltrata a pessoa, danifica, magoa, humilha, amedronta, e sentimos falta no personagem Rogério interpretado por Hugo Germano de expressar essa violência. A mãe, interpretada por Dani Ornellas expressa um sentimento de dor mais profundo do que a vítima. Ela exprime bem esse coração de mãe violentado. José karini interpreta de forma correta o padre mau caráter que deixa Otávio praticar felação, abusando do mesmo. E, Renato Carrera também tem uma atuação correta, o amante que assedia abusivamente, embora pudesse ter definido mais o seu personagem. Quem ele é? Sua origem? Ficou abstrato!
A direção é de Renato Carrera e Dani Ornellas, que foram precisos nas marcações e em detalhes de direção de atores.
Contudo, faltou a emoção. Teatro não é esporte. Não adianta ter apenas a técnica, tem q ter a emoção também. Teatro é arte! Tem que juntar técnica e sentimento!
Os figurinos criados por Dani Ornellas e Joana Seibel são adequados aos personagens.
Por sua vez, a cenografia criada por Daniel de Jesus é constituída por um círculo de pedras brancas, onde os atores encenam, e um faixa branca que atravessa esse mesmo círculo. Não há qualquer outro objeto, fato que facilita a movimentação dos atores.
A iluminação criada por Daniela Sanchez apresenta um bonito desenho de luz, que oscila por uma luz branca, as vezes mesclada com azul, e momentos de escuridão. A iluminação ajuda a realçar a interpretação dos atores.
Maria Alice Poppe imprime uma boa direção de movimento. Os atores se movimentam de forma intensa, apresentam um bom gestual, e as encenações de prática sexual acabam ganhando destaque.
Fides é uma boa peça de teatro, com um tema contemporâneo e pertinente, uma dramaturgia forte e engajada, e um bom elenco. Boa produção cênica!
Crédito das fotos: Rodrigo Menezes.
Alex Varela
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