Migração: Escola Amato Lusitano, em Portugal, discutiu diversidade cultural
- Ígor Lopes
- 3 de jun.
- 6 min de leitura

Num país onde o envelhecimento da população e a desertificação do Interior impõem desafios estruturais, Castelo Branco surge como um exemplo de renovação impulsionada pela imigração. Localizada na região Centro de Portugal, a cidade tem acolhido um número crescente de estrangeiros, transformando-se num polo multicultural, além de vivenciar mudanças estruturais importantes no tecido empresarial, económico e cultural.
Segundo o Plano Municipal para a Integração de Migrantes da Câmara Municipal de Castelo Branco, publicado em 2022, vivem no concelho mais de 1.600 cidadãos estrangeiros legalizados, provenientes de 68 nacionalidades diferentes, o que representa cerca de 3% da população residente local. Números que já sofreram alterações, entretanto.
As comunidades brasileira e cabo-verdiana destacam-se como as mais numerosas, de acordo com esse mesmo Plano Municipal, seguidas por britânicos, ucranianos, indianos, chineses, paquistaneses, guineenses, angolanos e sírios. Esta diversidade reflete-se também nas línguas que ecoam diariamente pelas ruas, escolas e locais de trabalho, onde o português partilha espaço com o crioulo cabo-verdiano, o inglês, o ucraniano, o hindi, o mandarim, o árabe e o espanhol, por conta da presença também de argentinos.
Para dar voz a essas comunidades, abordar os seus desafios e anseios e compreender de que forma a presença dos imigrantes está a reconfigurar Castelo Branco em vários domínios, a Escola Amato Lusitano promoveu, no passado dia 21 de maio, Dia Mundial da Diversidade Cultural para o Diálogo e o Desenvolvimento, uma mesa-redonda dedicada ao tema “(I)Migração: Perspetivas e Desafios”, no auditório da escola, uma iniciativa organizada pela Equipa de Apoio aos Alunos Migrantes.
Participaram no evento, Sofia Lourenço, presidente da Associação Mais Lusofonia; Bruno Vilela, presidente da Associação de Pais e Encarregados de Educação do Agrupamento de Escolas Amato Lusitano; Dário Falcão, coordenador-geral da Associação Amato Lusitano; Fátima Santos, em representação da Câmara Municipal de Castelo Branco e presidente da Cáritas Interparoquial de Castelo Branco; a Psicóloga Andrea Colôa; e Maria Lujan Marquez, mãe de uma aluna oriunda da Argentina. O painel abriu espaço para o testemunho dos alunos Lucía Alaniz, da Argentina; Marrwan Seifo, da Síria; e Dumilde Casimiro, de Angola; que falaram sobre a experiência ao chegarem à cidade albicastrense.
O encontro reuniu membros da comunidade escolar, representantes de diferentes culturas e profissionais da área da educação, saúde e integração, num momento marcado por muita reflexão sobre as experiências migratórias, os desafios enfrentados por quem chega a um novo país e as oportunidades geradas pelo diálogo intercultural.
“Existe uma grande riqueza na diversidade cultural”

Na opinião do professor Carlos Almeida, diretor do Agrupamento de Escolas Amato Lusitano e moderador do painel, Castelo Branco recebe hoje uma grande diversidade de estudantes e culturas, com diversas línguas diferentes que se podem ouvir na cidade e na região. Este responsável recorda que toda esta movimentação promove impactos na sociedade, mas também nos ramos da agricultura, saúde, empresarial, educação, entre outros, e que o foco deve ser atuar para integrar esses estudantes e fazê-los sentirem-se felizes no “nosso país”.
Por seu turno, Fátima Santos, em representação da Câmara Municipal de Castelo Branco e presidente da Cáritas Interparoquial de Castelo Branco, referiu que o poder da interculturalidade pode transformar as realidades locais e sublinhou o trabalho realizado no acolhimento dos imigrantes que chegam a Castelo Branco, promovendo diversas ações de acompanhamento e ajuda às famílias estrangeiras em termos de integração social, empregabilidade e conhecimento da cultura portuguesa. Ao receber os imigrantes, existe a ajuda para a procura por habitação, alimentação, saúde e documentos. Fátima frisou que o município apoia as associações locais que trabalham junto dos imigrantes.
“Existe uma grande riqueza na diversidade cultural”, avançou.
Dário Falcão, coordenador-geral e de Projetos da Associação Amato Lusitano, revelou que a entidade tem hoje ativos 12 projetos de “combate às vulnerabilidades”, em “áreas sensíveis”, bem como atuam para “estabelecer pontes” entre a sociedade e os cidadãos imigrantes, muitos deles, menores desacompanhados, no que toca à parte documental, na inserção nas escolas e na defesa da “exclusão social”.
“Os dois lados devem estar recetivos à essa integração”
Sofia Lourenço, presidente da Associação Mais Lusofonia, entidade que age no campo humanitário, desde Castelo Branco, em países como Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique, Portugal e Brasil, defendeu que “vencer o preconceito, de ambos os lados,” deve ser levado em consideração para “acolher os imigrantes”. De acordo com Sofia, existe preconceito de quem recebe, por não conhecer a cultura estrangeira, mas também, de quem chega a Castelo Branco, pois, “tivemos experiências de famílias que precisavam de ajuda e não pediam porque não acreditavam ou desconfiavam que poderia haver apoios e uma boa receção aos imigrantes na região”.
“Os dois lados devem estar recetivos à essa integração”, mencionou.
Durante a sua fala, Bruno Vilela, presidente da Associação de Pais e Encarregados de Educação do Agrupamento de Escolas Amato Lusitano, referiu ser importante que os pais possam sensibilizar os filhos em casa sobre o tema da imigração e a integração desse público, comentando ainda que este é um papel que também deve ser desempenhado pela comunidade junto dos jovens.
“Se mudarmos a nossa atitude, mudamos a atitude dos outros perante nós”, atestou.
A psicóloga Andrea Colôa preferiu destacar a presença da comunidade cigana na escola, que conta hoje com 14 alunos dessa etnia, recordando a necessidade de se “celebrar e valorizar a diversidade, mas também o diálogo”.
“Muitos dos imigrantes que chegam a Castelo Branco vêm de países em guerra e, por isso, a desconfiança”, mencionou.
Já Maria Lujan Marquez, mãe de uma aluna oriunda da Argentina, não deixou passar a oportunidade de comentar que a “educação em Portugal é mais completa” e que a segurança “aumenta a qualidade de vida”.
Envolver "toda a comunidade escolar"
Também presente no evento, a professora Paula Tavares, coordenadora da EBI João Roíz e coordenadora da Equipa de Apoio aos Alunos Migrantes do Agrupamento de Escolas Amato Lusitano, mencionou, à nossa reportagem, "os cerca de 190 alunos migrantes que frequentam o Agrupamento de Escolas Amato Lusitano, em Castelo Branco, oriundos de 27 países diferentes", um mosaico humano que, segundo esta educadora, "é responsável e sinónimo de uma riqueza e diversidade culturais inestimáveis, mas que acarreta desafios que não podemos menosprezar".
"A Equipa de Apoio aos Alunos Migrantes tem vindo a desenvolver um trabalho que visa contribuir para a boa integração destes alunos, potenciando o seu aproveitamento escolar, mas também promovendo a partilha e respeito pelas diferentes culturas", defendeu Paula Tavares, que recordou que, "neste âmbito, entre os dias 19 e 23 de maio, celebrou-se a Semana da Interculturalidade", uma iniciativa teve como tema "A Cor da Diversidade" e envolveu toda a comunidade escolar e outras entidades parceiras.
"A programação incluiu exposições, trabalhos interdisciplinares, apresentações musicais, poesia, partilha gastronómica e uma mesa-redonda com diversos convidados, nomeadamente alunos migrantes que partilharam as suas histórias de vida, proporcionando momentos de grande envolvimento e reflexão. A iniciativa teve como principal objetivo fomentar o diálogo intercultural, reforçando o papel da escola como espaço inclusivo e aberto à diversidade. Ao dar visibilidade às diferentes origens e percursos dos seus alunos, o Agrupamento Amato Lusitano reafirma o seu compromisso com a educação para a cidadania global", explicou esta responsável.
“estou bem confortável em Portugal”
Os três alunos presentes no painel, Lucía Alaniz, Marrwan Seifo e Dumilde Casimiro, revelaram as experiências ao chegarem à cidade albicastrense, sendo a comunicação uma barreira no caso dos jovens nascidos na Síria e na Argentina. Porém, relataram que essa dificuldade foi ultrapassada com a ajuda dos professores, dos colegas de turma e dos auxiliares. Ao aprenderem a língua portuguesa, conquistaram novos amigos, socializaram e, hoje, sentem-se integrados e gratos a Portugal por os ter recebido.
“Sinto saudades da Argentina, mas estou bem confortável em Portugal”, disse Lucía Alaniz, argentina.
Marrwan Seifo, da Síria, diz ter recebido muito apoio no aprendizado da língua e que Portugal é um “país bom”, onde pode praticar a religião islâmica.
Dumilde Casimiro, de Angola, reforçou o seu progresso na integração local, destacando ter já conquistado espaço no âmbito do futebol, em termos profissionais.
“Nunca pensei em emigrar. Hoje, o futebol deu-me oportunidades. (…) Temos de aproveitar as oportunidades da vida”, comemorou.
Saúde como tema central
Fonte dos cuidados de saúde em Castelo Branco revelou à nossa reportagem que muitos imigrantes que residem na região têm hoje a possibilidade de receber tratamento médico adequado para doenças que ainda não haviam sido diagnosticadas nos seus países de origem.
“Há muitos imigrantes que foram diagnosticados com cancro do aparelho digestivo e que hoje têm tratamento”, disse essa mesma fonte.
Música e gastronomia para celebrar a diversidade
O evento ficou marcado ainda por momentos musicais: um da responsabilidade de um grupo de alunos migrantes da Escola Profissional do Conservatório de Castelo Branco e uma exibição final de dança, levada a cabo por Florência, professora de tango, proveniente da Argentina.
No final da sessão, seguiu-se uma partilha gastronómica, onde foi possível saborear pratos típicos de várias origens culturais. Um momento de convívio que reforçou a importância da diversidade como elemento de união e de enriquecimento social.
Fotos: Agência Incomparáveis
Ígor Lopes

Comments