Eu e Você - Você e eu - Eu e Você
- Susi Cantarino

- 20 de out.
- 2 min de leitura
Por que, no português do Brasil, o “eu” vem antes — e o que isso diz sobre nós

Ao chegar ao Brasil, uma das primeiras coisas que me soaram diferentes — e até um pouco estranhas — foi o “E” que se cola ao final de quase toda palavra falada. De repente, tudo ganhava uma vogal extra: “HollywoodE”, “FacebookE”, “milkshakeE”. Era como se a língua se recusasse a terminar em silêncio, prolongando o som num gesto espontâneo e musical.
Mas não foi só isso. Outra surpresa veio logo depois, numa expressão aparentemente banal: “eu e você”. Soava invertida. Em muitas línguas, o outro vem primeiro. Em inglês, diz-se “you and I”; em espanhol, “tú y yo”; em alemão, “du und ich”. Colocar o “eu” na frente, nessas culturas, é quase um ato de egocentrismo linguístico.
No português do Brasil, porém, essa ordem se inverte com naturalidade. O “eu” chega primeiro, sem culpa. Nas conversas, nos filmes, nas canções, a fórmula se repete com uma naturalidade quase afetiva: “Eu e você pra sempre”, “Eu e você contra o mundo”, “Eu e você, dois corações em um só”.
Aparentemente, o português brasileiro trocou a etiqueta pela emoção. O “eu” que se adianta aqui não busca protagonismo; ele apenas inaugura uma relação. É um “eu” que chama, que convida o “você” para formar um “nós”.
Talvez isso revele algo mais profundo sobre o modo brasileiro de se comunicar: uma preferência pelo afeto em vez da formalidade, pelo ritmo em vez da regra. Enquanto outras línguas preservam a distância da polidez, o português do Brasil aposta na aproximação da fala — e nisso constrói sua própria forma de cortesia.
No fim, o “eu e você” brasileiro é menos um gesto de ego e mais um sinal de intimidade. O “eu” vem primeiro, sim — mas apenas para que o “você” chegue logo depois.
A língua, afinal, é um espelho do modo de ser de um povo. Enquanto outras culturas enfatizam a formalidade e a distância, o português falado no Brasil privilegia a afetividade, o ritmo, a fluidez.
A propósito, essa preferência não é exclusivamente brasileira. No hebraico, existe a expressão “ani ve ata” — literalmente “eu e você”. Na música icônica de Arik Einstein, “Ani ve Ata, neshané et haolam”, traduzida como “Eu e você vamos mudar o mundo”, a ordem dos pronomes transmite intimidade, cumplicidade e propósito compartilhado, não egoísmo.
No francês, embora a forma formal seja “toi et moi” (“você e eu”), em poesias e canções muitas vezes aparece “moi et toi”, com efeito rítmico e emotivo semelhante ao português. No japonês, em contextos poéticos, “watashi to anata” (“eu e você”) pode preceder a ordem “educada” para enfatizar o sujeito que fala e o laço afetivo. Até em músicas em inglês, como algumas composições de folk ou pop romântico, vemos versos começando com “me and you” em vez do formal “you and me” — quebrando a regra por sonoridade e intimidade.
E você, o que acha?
*****Susi Sielski Cantarino*****
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