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Revista do Villa

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Convidamos você a se juntar a nós nesta jornada, acompanhando as novidades e publicações

em forma de matérias, entrevistas e artigos realizados pela equipe de colunista.

Entrevista: Evandro Martini | Sommelier Ítalo-brasileiro

Sommelier Ítalo-brasileiro que retorna ao Brasil depois de uma experiência de 18 anos na Itália, período este aplicado no desenvolvimento de sua técnica em degustação de vinhos. Atuou por seis anos na produção de uvas, com foco no cuidado, gestão e manuseio das parreiras, sendo chefe de vindima e selecionador de campo. Durante dois anos apoiou a parte produtiva de vinhos, conhecendo os processos da mágica transformação do suco de uva em vinho.


Taça de vinho do porto - ©Jon Sullivan/Wikimedia Commons
Taça de vinho do porto - ©Jon Sullivan/Wikimedia Commons

Com dez anos na gerência de vendas da Vinícola Pilandro, na Região Marche, responsável pelo lançamento dos vinhos Verdicchio dei Castelli di Jesi. Professor Sommelier, escritor, fundador do Instituto Evandro Martini – Estudos do Vinho, que tem a missão de ensinar e formar novas gerações de consumidores e profissionais enófilos.

 

“Uma taça de vinho melhora em boa companhia.”


Um novo roteiro enoturístico na Itália: onde tomar vinhos de vulcão


Desde 2006, todos os anos participo da Vinitaly, principal feira de vinho na Itália, o concurso e exposição internacional de vinhos acontece em Verona, a terra de Romeu e Julieta, mas a região é o Vêneto - local de onde mais saíram imigrantes para o Brasil, por sinal minha família foi uma que atravessou o Atlântico em barcos a vapor lá pelo idos de 1890. A feira recebe mais de 4 mil produtores e quase cem mil frequentadores todos os anos.

 

Vou contar algo da última grande surpresa que tive na Vinitaly, a feira internacional de vinhos em Verona: os vinhos do ETNA. Vinhos vulcânicos, vinho de vulcão, vinho do maior vulcão ativo da Europa - uma experiência singular para quem aprecia grandes vinhos, os enoviajantes compreendem isso. Como conhecedor dos vinhos italianos, eu já sabia da escalada de qualidade dos vinhos daquela região, arrisco dizer que em pouco tempo os vinhos vulcânicos vão se tornar celebridades. Nas minhas degustações na feira, em relação aos produtores ali presentes, deu para perceber a vontade de crescer em qualidade. 

 

A uva Nerello Mascalese representa o mundo das descobertas das uvas autóctones na Itália, estão proporcionando ótimos vinhos e com tendência de em breve período de se tornarem grandes estrelas do vinho italiano. As principais uvas além da Nerello Mascalese são Nerello Cappuccio e Corricanti, que são tintos, e o Catarrato para o vinho branco.

 

Na degustação dos vinhos tintos, espere notas minerais do início ao fim, frutas vermelhas, mas não doces, os vinhos que passam por barricas tendem à maturação nas notas de café e chocolate amargo, do mais jovem ao mais envelhecido, a persistência na boca é extremamente longa e forçada a salivação. 

 

Na degustação dos brancos, as notas minerais lhe farão sentir o sal marinho, bicarbonato e frutas exóticas como o liche e o damasco, uma certa secura da boca provocando salivação nas partes mais internas da boca, ideal para acompanhar frituras de peixes e legumes.


 

Os vinhos vulcânicos do Etna

 

A ilha da Sicília no extremo sul da Itália tem fatores bem curiosos e ótimos vinhos, imagine os feitos ao pé de um vulcão? Os vinhos vulcânicos têm sido muito apreciados. O clima quente e invernos amenos deixam a ilha bem própria para vinhos fortes e temperamentais, não tenha medo nunca de um vinho Siciliano de 14,5% de álcool, mesmo sendo vinhos de graduações alcoólicas altas são sempre muito saborosos pelo amadurecimento completo dos cachos de uva. Na microrregião do Etna, o cultivo da uva é bem difícil, quase os considero viticultores heroicos, pois há muitas particularidades do terreno e da geografia que exigem acentuada criatividade para levar avante o cultivo das parreiras. Para alguém trabalhar ao pé de um vulcão que é o mais ativo da Europa, o Etna, a pessoa tem de ter muita paixão pelo que faz. Em 2024, o Etna teve erupções de quantidade importante de lava.

O solo vulcânico é bom para o plantio de uvas, favorece os vinhos vulcânicos, mas o plantio só pode ser feito em pequenas localidades ao pé do vulcão, e neste solo a uva Nerello Mascalese está fornecendo ano após ano sempre uma qualidade a mais. Minha experiência me diz que quanto mais velha a vinha, melhor é o produto, e eu creio que agora que a maioria das vinhas desta região estão acima dos 40 anos, os vinhos estão na ascendente de qualidade, por este motivo eu tenho propriedade em dizer que logo estaremos vendo os preços desta pequeníssima região subir em espiral.

 

Os produtores estão todos no mesmo lado do vulcão, pois ali o solo está pronto e não corre risco de que o material expelido pelo vulcão os atinja. As vinícolas estão a Leste do Vulcão formando uma meia lua em torno da caldeira magmática.


Os cerca de 200 produtores de vinho e outros 400 de uva dividem este pequeno território de 1200 hectares, estão divididos também por terroir, e cada setor da área produtiva representa uma real mudança das características aromáticas e gustativas do vinho. 

 

Confira a forma de simplificar as 4 divisões:

 

  • O Versante Norte: o vinho mais mineral, equilibrado e com ótima tendência de guarda.

  • Versante Leste: os com grande complexidade aromática, tânicos e sabores profundos.

  • Versante Sudeste: vinhos frutados, com mais corpo e mineralidade equilibrada.

  • Versante Sudoeste: os mais vivazes, mais alcoólicos e taninos mais macios.

 

  

O enoturismo e o vulcão mais ativo da Europa

 

Para se ter ideia da importância dessa microrregião, os produtores decidiram produzir menos garrafas de vinho para poderem melhorar ainda mais a qualidade do vinho de vulcão. Isto na prática quer dizer: quanto menos cachos tenha um pé de uva, mais elementos concentrados as uvas terão, fazendo por sua vez vinhos mais importantes.

 

Na região do Etna estão sendo realizadas muitas obras para favorecer o enoturismo. Em razão da alta busca pela experiência de se provar o vinho produzido perto do vulcão ativo, as cantinas se preparam para receber turistas de toda a parte do mundo, admiradores da natureza, curiosos por causa da visita ao vulcão e também para recepcionar os enoviajantes.

 

Então, na próxima vez que pensar em viajar para a Itália, faça uma parada obrigatória em Catania, que é a cidade do Etna, você terá uma belíssima surpresa, pois poderá visitar algumas “cantinas” da região e entender um vinho feito com muita coragem e ótimas uvas.


Fernanda Torres - ©Adam Chitayat/Wikimedia Commons
Fernanda Torres - ©Adam Chitayat/Wikimedia Commons

Qual é o melhor vinho para comemorar a premiação do Globo de Ouro?

 

Nos últimos dias, um assunto em alta foi a premiação do Globo de Ouro. Isso me fez pensar na realização de uma atriz como Fernanda Torres em receber um prêmio internacional pela excelente atuação em um filme brasileiro.


Representar a cultura cinematográfica de um país, nesse nível, pode ser comparado, pelos amantes do futebol, à honra de ganhar uma Copa do Mundo sendo artilheiro.

 

Diante disso, fiz outro tipo de comparação, comum ao meu dia a dia, e me perguntei: qual vinho eu escolheria para comemorar um evento como a premiação do Globo de Ouro? Quais critérios de escolha eu usaria? 


Então, vamos lá!



Refletindo, cheguei à conclusão de que: a marca de espumantes Italiana que se usa para festejar a vitória na Fórmula1 é a Cantina Ferrari, uma empresa de sólida reputação da região italiana do Trento, a qual fornece as famosas garrafas para o momento do pódio. Quem nunca viu os pilotos brincarem com as espumas, encharcando uns aos outros no tão tradicional momento da vitória? Uma alegria singular – uma prática repetida com euforia única, presenciada há longos anos por fotógrafos e cronistas do esporte. Imagens e textos comoventes nascem da garra e determinação dos automobilistas, é impossível não remeter a Ayrton Senna - automobilismo e vitória se tornam sinônimos! Lembro bem de uma imagem dele colocando a garrafa sobre a cabeça, num ato de “autobatismo” com a vitória, numa espécie de profundo agradecimento pela conquista.

 

É também curioso o caso de um consórcio italiano que fechou negociações com uma associação de tênis profissional para que ambos se tornassem os fornecedores dos vinhos para as competições. A Asti DOC (Denominação de Origem Controlada) possui mais de 100 associados e produz os espumantes e vinhos da região do Piemonte, numa parceria que permite que desde 2023 eles levem suas marcas para as comemorações.

 

Agora, voltando ao foco: o Globo de Ouro que Fernando Torres, nossa atriz, conquistou mereceria qual vinho?

 

Logo pensei num vinho espumante brasileiro premiado internacionalmente, o Casa Valduga, por exemplo. Cabe frisar que os vinhos espumantes do Brasil têm um reconhecimento internacional de longa data, embora as exportações aparentemente ainda não façam jus à qualidade das nossas bolhas. No entanto, eu também poderia recomendar à nossa Fernanda um espumante de uma DOC de Pinto Bandeira - RS. Após anos e muito empenho dos produtores, foi possível registrar essa região como DOC. Por meio dessa certificação, os produtores da região se comprometem a respeitar processos de produção das uvas e da fabricação do espumante, fornecer aos órgãos estatais e privados liberdade para controlar e fiscalizar os processos.

 

Taça de vinho na vinha - ©Itu/Wikimedia Commons
Taça de vinho na vinha - ©Itu/Wikimedia Commons

Considerando outras opções, para esta comemoração poderíamos, quem sabe, propor um Franciacorta italiano, feito na região da Lombardia, norte da Itália. Uma combinação perfeita e proporcional à classe, à elegância e ao perfil extrovertido de Fernanda Torres. 

 

A propósito, não há como deixar de fora a pluralidade que marca o povo latino, e isso remete a um cava espanhol, por que não? Noites quentes, ao som das músicas mediterrâneas espanholas, as bolhas brilhariam ao ritmo das danças e festas, o sangue latino fervilha e sabe festejar.

 

Atualmente tem aumentado a preferência pelos espumantes ingleses. Sussex, na Inglaterra, pode ser considerada a melhor região para essa produção, tem sido comparada à Champagne, na França, e conta com uma enorme qualidade e performance na taça – sendo esse espumante de Sussex uma das minhas melhores degustações em 2024. Em contrapartida, penso que a seriedade anglo-saxônica ficaria para uma tarde mais íntima e com poucos amigos. 

 

Obviamente, festejar com uma garrafa de champanhe representa o clímax em comemorações em muitos lugares do mundo – grandes produtores, ótimos produtos, experiências explícitas nas taças e nos olhares, são o máximo em meios às opções aqui descritas para a melhor atriz da premiação. 


Em tempo, cabe lembrar que um Veuve Clicquot combinaria de forma inebriante, a história da viúva Eunice Paiva contra um sistema, que é o enredo do filme Ainda estou aqui, com o champanhe da viúva que também já foi um filme (A viúva Clicquot  a mulher que formou um império, 2023), a qual teve sua história de amor interrompida pela lástima da morte... 

 

Enfim, histórias não faltarão, bem como, mais sugestões não faltariam, mas, exatamente agora, o que de fato penso: deixaria um Dom Pérignon Vintage debaixo da cama para dar sorte no evento do Oscar.

 

 

Evandro Martini - Sommelier Ítalo-brasileiro.

 

1 – Quem era Evandro Martini antes de conhecer as vinhas? Conte um resumo de sua infância, juventude até chegar neste universo dos vinhos.

 

Nascido em Curitiba, em uma família que veio do interior do Paraná em razão da crise do café. Estudei e trabalhei em diversos ramos, com acentuado perfil para vendas. Fui desde auxiliar financeiro em um canal de televisão até baixista em uma banda. Casei em 2.000, mudei para a Itália em 2.006 e meu filho Brenno nasceu lá em 2.010. Desde então, minha trajetória foi se direcionando para o universo do vinho.

 

2 – Quando começou a trabalhar como Sommelier te passa um filme na cabeça... conte as aventuras que passou neste contexto internacional, citando Itália, entre outros países que conheceu visitando plantações de uva.


Eu trabalhava na Itália no campo gerindo o trabalho nas parreiras, quando apareceu um curso da ONAV - Organizzazione Nazionale Assaggiatori di Vino. Eu fiz o curso e descobri um talento: que o meu paladar é limpo, talvez por nunca ter fumado e ter bons hábitos alimentares. Isso foi muito útil para avaliar os vinhos da empresa em que trabalhei. Antes de engarrafar um vinho, muitos degustadores devem avaliar para que nenhum defeito ou sobressalência de algum aspecto gustativo desvie do objetivo do enólogo, e para mim era realmente muito fácil fazer estas avaliações. 

 

A maior curiosidade que me impactou foi uma visita à Grécia, fomos a uma vinícola que tinha por característica deixar o vinho oxidar, aquilo parecia um defeito. Fiquei muito intrigado com essa peculiaridade. No entanto, à noite fomos a uma festa típica grega - e lá tudo fez sentido, o vinho servido harmonizava espetacularmente com a gastronomia daquela região, o queijo fresco era presente em diversos pratos, o efeito da oxidação do vinho aprimorava aqueles sabores. Quebrar barreiras de mentalidade num mundo tão tradicionalista como o do vinho acaba se tornando uma vantagem.

 

3 – Qual foi a grande fase de sua vida neste conhecimento e apresente suas conquistas através do seu trabalho relacionado à natureza das vinhas.

 

Aprendi a gerir o vinhedo com Giovani, um senhor de 75 anos. Ele respeitava a plantação como se fosse a família dele, eu internalizei esse entendimento. Em 2015, eu gerenciei a vinha sozinho, pois Giovani tinha ido cuidar das vinhas celestiais. Aquela safra estava caminhando muito bem, perto da perfeição, quando numa conversa com o Pietro Lavelli, que era o proprietário, decidimos fazer vinhos concentrados e importantes para guarda, isto é, vinhos que podem durar muito tempo engarrafados. Fiz as podas para que as uvas ficassem com pouca água e muita substância, e isto funcionou, os vinhos: Centanni Barbera e o 110 & Lode Merlot ficaram fantásticos, com pontuações acima dos 96/100. 

 

Aprender e executar, isso me trouxe muita satisfação. Realmente naquele momento eu poderia dizer que honrei o que aprendi. Por outro lado, em 2018, quando eu era Diretor Comercial de Região, fiz uma ótima campanha de publicidade e com um vinho recém-criado: Verdicchio dei Castelli di Jesi DOC - IL Pozzetto 2018, ganhamos o reconhecimento da guia de vinhos “Gambero Rosso”, a mais importante da Itália.

 

4 - Tem um trecho da Sagradas Escrituras fala de um milagre onde transforma água e vinho, tornando o segundo melhor que o primeiro... com base neste acontecimento você já presenciou algum consumidor falando de cura ao tomar vinho?

 

Essa pergunta me pareceu um pouco inusitada, mas, depois de refletir, posso afirmar que sim. Vou contar o que presenciei. Durante o tempo em que eu estava na Direção Comercial fazíamos muitos eventos, eram jantares, degustações, almoços, aperitivos, reuniões e toda a sorte de confraternizações. Um grupo em particular sempre me pedia para fazer aperitivos. Começaram com poucos, mas com o passar do tempo, o grupo se tornou bastante numeroso, eram empreendedores da região que buscavam um lugar para descontração. O vinho pode contribuir com a melhora da qualidade de vida. Naquele grupo, eu vi essa afirmação se concretizar, no início as conversas não passavam de trivialidades como futebol e notícias corriqueiras, mas creio que o consumo do vinho somado a um ambiente adequado fez com que as conversas subissem de nível.

 

Depois de um tempo, os assuntos sobre alimentação saudável, sustentabilidade, qualidade de vida e de tempo, eram naturais nas rodas de conversa. Eu vi que esses momentos regados a aperitivos contribuíram para que houvesse uma melhor conexão de ideias, formando um tipo de rede intelectual - e a cada duas semanas fui notando uma melhora na qualidade de vida daquelas pessoas. 

 

Eu vejo o vinho como uma possibilidade de uma vida melhor, pois permite uma quebra na rotina e normalmente quando você se dedica a algo - nesse caso o universo do vinho - você passa a ser mais criterioso, pois tende a se preocupar com a escolha de alimentos que harmonizam com o vinho, consequentemente o seu paladar o leva a escolhas mais específicas e saudáveis. Poderia afirmar que o vinho, assim como o hábito da leitura, pode transformar a mentalidade das pessoas.

 

5 – No momento do ciclo de vida ao termos consultas periódicas com cardiologistas, falam para beber vinho que é bom para o coração... além deste fato a companhia de pessoas amáveis em determinado ambiente fica mais agradável? O que pensa neste sentido Evandro?

 

Depois de anos falando que o consumo de vinho faria bem à saúde hoje há muitos artigos que pautados em pesquisa falando ao contrário. Meu entendimento sobre o consumo de vinho e saúde é muito mais holístico, isto é, devemos ter um olhar global para emitir uma opinião. Em relação aos países onde o consumo de vinho é maior, a expectativa de vida acompanha esse percentual. O vinho é um alimento, serve para nos nutrir, o álcool que o vinho possui serve para manter no tempo esse alimento, o álcool pode fazer mal se consumido em alta quantidade ou em produtos de baixa qualidade. Melhorar o produto e o consumo deve ser a meta de quem aprecia o vinho. Considero uma pena que boa parte dos produtores sugeridos pelo mercado acabam usando muitos recursos químicos para obter vinhos mais baratos.

 

Claro que são produtos que não fazem mal à saúde diretamente, mas qual é o limite para correções químicas dos vinhos? Qual a reação suportável para cada pessoa desses aditivos do vinho? Hoje vemos uma quantidade de pessoas com os mais diversos tipos de alergias alimentares, a maioria jovens que ainda não experimentaram o vinho, minha pergunta é: há boas pesquisas sobre os efeitos dos produtos químicos nos alimentos industrializados? Isso é algo com que devemos nos preocupar. Mas tenho certeza de que uma taça de vinho de um produtor que respeita o consumidor faz um bem incalculável.

 

6 – Atualmente temos variedades de espécies de uvas, utilizadas na fabricação de champanhe, vinho, geleia... o próprio suco integral da uva misturado com maçã, entre outras frutas. Qual a margem de consumo hoje no Brasil? E se há algum país com maior demanda? Explique, por favor.

 

Há mais de 5 mil tipos de uvas, sendo usadas pelo ser humano e pelos animais em diversas regiões do mundo. A planta da uva é muito produtiva, bem cuidada pode produzir muitos quilos de uva. Existem basicamente duas categorias: Vitis Vinífera e Vitis Labrusca. A diferença entre elas é a quantidade de açúcares que produzem. As viníferas são extremamente doces, facilitando a transformação do açúcar em álcool, por isso são utilizadas para fazer vinhos, já a labrusca, sem essa capacidade de acumular tanto açúcar, é muito melhor para o consumo.

 

Exemplificando, a uva Merlot que é Vitis Vinífera é docíssima, se você comer essa uva madura vai te dar muita sede, coisa diferente ocorre se você consome a uva Isabel que é Labrusca, cultivada no Brasil, a quantidade dela de açúcares é baixa dando lugar para acidez e minerais que ajudam a matar a sede. Por isso na Europa é muito difícil encontrar suco de uva, pois eles cultivam a Vitis Vinífera, como dito anteriormente, é muito doce para o consumo direto. Falando sobre o suco de maçã que em quase todos os sucos de frutas é acrescentado, vale dizer que a tecnologia criou macieiras extremamente resistentes a doenças, criando uma superprodução, mas deixando o fruto com pouco gosto característico, e nisso a indústria aproveita para inserir e baratear outros sucos de fruta, um espécie de “efeito chuchu”, aumenta o volume e leva pouco sabor.  

 

7- Qual é o vinho considerado mais caro hoje e qual origem?

 

Um tema interessante que eu gostaria de expandir: o preço do vinho. Poderia citar os grandes vinhos franceses das melhores safras históricas, garrafas que chegam a centenas de milhares de dólares, são leiloadas assim como ocorre com quadros e obras de arte. Mas sugiro refletir o que leva um vinho a custar tão caro? Poderíamos dizer que é pela raridade, pelas poucas garrafas que existem, mas então eu argumento sobre pequenos produtores de 1.000 garrafas, mas seus vinhos custam pouco. Dizer sobre a localização do vinhedo, Petrus que é um dos vinhos mais caros do mundo é vizinho de outros tantos produtores do Pomerol que não chegam nem a 10% do preço do Merlot Petrus. A safra? Quando é o melhor ano, como aconteceu em 2015, todos os vinhos melhoram. Dessa forma, o preço se mantém o mesmo por questões de mercado. O preço das safras excepcionais tende a aumentar de preço dez anos depois. Qual é o elemento que faz o vinho ter preços altíssimos? A minha experiência reconhece que o fator principal é a história. Sim, se você tem um vinho, você possuirá a história daquele produto.

 

Por exemplo: é como um livro impresso por Gutemberg, foge do mundo material e entra no campo da consciência histórica, representa uma empresa, uma família, uma vida, todo o esforço em criar a bebida que representa a criatividade humana e a transformação natural. Sobre preço, ele diminui quando entendemos o valor. Um exemplo, pagaram pelo Domaine Romainée-Conti 1945 482.000,00 Euros, o equivalente a 3.015.430,00 reais, observe o ano.

 

8 – Quando você visita as plantações de uva, consegue identificar a qualidade pela cor da uva? Qual a coloração ideal para estar no ponto?

 

Nossa que pergunta interessante. Existem muitas regras fáceis para quem planta uvas, uma delas é que dentro de um território, onde uma uva se adapta bem, quase tudo ali vai ser aquela a dominante. Por exemplo: se estou na Serra Gaúcha, os vinhedos que mais eu vou ver são da uva bordô, mais plantada em absoluto, muito adaptada à região. Caso eu vá para a região de Champagne, na França, com certeza vou verificar a Chardonnay em todo lugar. É tipo a regra do futebol que em time que está ganhando não se mexe. Vou contar uma coisa que aconteceu comigo, quando estava nas minha primeira vindima, o período de colher as uvas. Naquela ocasião, no meio da uva Turbiana havia algumas plantas de Chardonnay, então durante o ano marcamos onde estavam aquelas plantas, reconhecemos pelo desenho da folha e pela cor mais intensa delas.

 

Na hora da vindima, observamos que o trabalho de identificar e sinalizar foi inútil, pois eram totalmente diferentes das outras, não tinha como errar. Funciona que cada varietal tem sua própria formação de folhas.

 

Sobre a maturação ideal para as uvas, na Itália temos um ditado: “Chi trova il giorno giusto per la vendemmia presto gira in Ferrari per la campagna”, ou seja, Quem encontra o dia exato para fazer a colheita das uvas, logo vai ter uma Ferrari para ir andar na fazenda. Isso indicava a importância desse dia. Tem algumas curiosidades como: o melhor dia da colheita são 100 dias depois da floração, quando os pássaros começam a comer as uvas ou os javalis as derrubam no chão, histórias não faltam. Hoje na realidade são feitas medidas para ver a curva de maturação. Ideal é quando os açúcares se estabilizam com os ácidos, o máximo do doce com a melhor acidez.

  

9 – Você já ganhou alguma premiação sendo degustador de algum Cliente? Comente.

 

Bem, eu estive no comando das vendas de uma Região da Itália, Marche, e posso dizer que o maior prêmio foi que um brasileiro conseguiu vender por 3 anos seguidos todo o estoque de vinho, chegando a ter que negar novos clientes, pois me faltava o produto. Minha experiência em adaptar o nosso vinho aos pratos que os restantes propunham me fez ser reconhecido como o brasileiro do vinho.

 

Um fato curioso, um cliente que conquistei queria o vinho mais importante nosso, que era Passione Verdicchio Superior, mas quando fui provar os pratos daquele restaurante notei que o nosso Pozzetto, que era um vinho mais básico, seria muito melhor para harmonizar o estilo do tempero dele, tendo base em verdes como a salsinha e a cebolinha, o que harmonizava muito mais com o vinho mais simples e mais barato. Quando sugeri, o proprietário não acreditou muito, achando que o Superior faria mais efeito, mas por insistência minha ele colocou os dois vinhos na carta, o vinho Pozzetto virou febre e naquele restaurante era quase só consumido este vinho, o proprietário entendeu a importância de um Sommelier.


10 - Você escreveu em nossa revista sobre os vinhos do vulcão Etna. Faça um link dessa ideia com uma mensagem para aqueles que estão iniciando seus estudos a respeito do vinho. 

 

Os vinhos do vulcão Etna, na Sicília, são uma metáfora sobre brincar com o perigo. Essa é uma mensagem parecida com a que eu digo sempre aos iniciantes do mundo dos vinhos, brinquem com os mais variados tipos de vinho, sejam curiosos e arrisquem nos mais diversos estilos, mantenham a cabeça aberta para que o inusitado seja uma bela surpresa na taça, não percam oportunidade de provar novidades, todo o vinho melhora se a companhia é boa. Se quer estudar, vale a pena. O Brasil está precisando de críticos no vinho, pessoas com conhecimento apropriado para melhorar o nosso produto e consumo. Voltei ao Brasil com o objetivo de desenvolver projetos para o conhecimento dos vinhos e o bem estar que isto proporciona.


 

João Paulo Penido



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