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A arquitetura da dor em “O brutalista”

Atualizado: 1 de mar.

São três horas e meia de filme! Tem um intervalo no meio, coisa que eu não via desde Titanic. Apesar do tempo para contar uma história que passa por várias épocas, o que vemos é o que uma pessoa profundamente marcada pela guerra se permite fazer em nome do pertencimento. O filme narra a trajetória do arquiteto László Tóth, um arquiteto judeu-húngaro interpretado por Adrien Brody.


A história começa com ele saindo de sua terra natal e chegando aos Estados Unidos. Aí, vemos uma das imagens mais marcantes do longa: a Estátua da Liberdade de cabeça para baixo até ela ser ajustada à tela.

 

Voltando a Adrien Brody, a atuação se destaca por sua capacidade de transitar por diferentes fases da vida de Tóth, mostrando a evolução emocional e psicológica do personagem; é uma dor silenciosa e contida, mas que está lá, vinda de uma guerra. Sua trajetória vai desde a vulnerabilidade de um sobrevivente do Holocausto que é abrigado na casa de um primo até a determinação de um arquiteto visionário enfrentando as adversidades do Novo Mundo. Nesse novo mundo, ele trabalha na loja de móveis do primo e já mostra a que veio: abandona o design tradicional e cria mobília modernista. Então, a firma é contratada para reformar uma biblioteca em estilo clássico para o industrial Harrison Lee

Van Buren, interpretado por Guy Pearce.

 

É Harrison que acompanha Tóth na maior parte do filme e funciona como um antagonista dúbio: ao mesmo tempo que idolatra o talento de Tóth, é capaz de cometer atos vis contra o arquiteto. Van Buren é um megalomaníaco e vive essa dualidade o tempo inteiro. Sua interpretação é um tanto estereotipada, mas revela camadas de ambiguidade moral, refletindo as tensões entre mecenato e manipulação, e adiciona profundidade ao conflito central do filme. Van Buren, aparece como um salvador no começo, mas revela-se uma pessoa com intenções que misturam altruísmo e controle, refletindo as complexas dinâmicas de poder entre benfeitor e beneficiário: quem manda em quem.

 

Felicity Jones interpreta Erzbete Tóth e sua presença no filme é delicada quanto e forte. Como esposa de László Tóth, ela não é apenas uma companheira, mas uma força que equilibra os traumas do marido e a vontade dele de vencer nesse novo mundo. Enquanto László se perde na luta por reconhecimento e na tensão com Harrison Lee Van Buren, Erzbete é o fio que o liga à sua própria humanidade. No entanto, seu papel vai além da figura de apoio; há uma complexidade em sua jornada, pois ela também é uma imigrante tentando encontrar um espaço próprio nesse novo mundo. Ela consegue um emprego em um jornal porque é formada em Oxford e sua condição física traz profundidade à sua personagem, rendendo boas cenas. Erzbete transmite, por meio de pequenos gestos e olhares carregados, o conflito interno de uma mulher que vê seu casamento se transformar e que, aos poucos, se vê engolida pelas circunstâncias, mas ela não se entrega: bonito de ver.

 


A direção de Brady Corbet tem uma estética que reforça a atmosfera de enclausuramento e opressão. A fotografia, assinada por Lol Crawley, utiliza o formato VistaVision para criar composições amplas que, paradoxalmente, intensificam a sensação de isolamento, de aprisionamento do protagonista. O uso de paletas de cores frias e iluminação contrastante enfatiza o estado emocional de Tóth e os ambientes que ele habita, tudo a ver com a arquitetura brutalista.

 

A direção, aliada a um roteiro que não teme explorar as profundezas da psique humana, traz em uma narrativa que é tanto um estudo de personagem quanto uma reflexão sobre os impactos duradouros da guerra e da imigração, questão importantíssima a ser discutida na atualidade. “O Brutalista” não é apenas um filme sobre arquitetura ou uma narrativa; é uma história de resiliência do espírito humano diante das adversidades mais insuperáveis para encontrar um lar.


Por Cláudia Felício (autora best-seller, roteirista e crítica especializada em cinema)


 

Cláudia Felício


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