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50 Anos da Morte de Vladimir Herzog: A Luta Inesquecível pela Verdade e Democracia

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Em 25 de outubro de 1975, durante o auge da repressão da ditadura militar brasileira, o jornalista, professor e dramaturgo Vladimir Herzog, carinhosamente conhecido como Vlado, foi covardemente assassinado nas dependências do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), em São Paulo. Cinquenta anos depois, sua história e legado continuam a ser um farol na defesa dos direitos humanos e da liberdade de imprensa no Brasil.


​A História de Vlado e a Farsa da Ditadura


​Nascido na Iugoslávia (atual Croácia) em 1937, Vladimir Herzog veio para o Brasil com sua família fugindo do antissemitismo durante a Segunda Guerra Mundial. Formado em Filosofia pela USP, Vlado construiu uma carreira sólida e respeitada no jornalismo, trabalhando em veículos como o jornal O Estado de S. Paulo e a BBC de Londres, antes de assumir a direção de telejornalismo da TV Cultura de São Paulo, na década de 1970.


​Militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Vlado se apresentou voluntariamente ao DOI-Codi para "prestar esclarecimentos" sobre suas atividades e ligações, no auge de uma onda de prisões e torturas. No entanto, ele jamais saiu vivo do quartel-general do II Exército.


​A versão oficial divulgada pelo regime militar foi a de suicídio, uma farsa grotesca e cruel. A foto manipulada e divulgada pelos agentes do DOI-Codi, que mostrava Vlado supostamente enforcado em uma cela, com o corpo em suspensão incompleta e a calça afivelada, logo se tornou um símbolo da barbárie da ditadura. Posteriormente, foi comprovado que Vladimir Herzog foi torturado e morto por agentes do Estado, um crime de lesa-humanidade que o regime tentou acobertar. A retificação de seu atestado de óbito, em 2013, a pedido da Comissão Nacional da Verdade (CNV), encerrou oficialmente a farsa do suicídio, reconhecendo o assassinato por tortura.


​O Legado de um Símbolo da Resistência


​A morte de Vlado, um intelectual e jornalista de grande prestígio, chocou o país e teve uma repercussão imediata e profunda, ajudando a frear, momentaneamente, a máquina de repressão e assassinatos políticos do regime.


​Uma semana após o crime, a reação da sociedade civil culminou em um dos atos públicos de maior repúdio à ditadura militar desde 1964: a Missa de Sétimo Dia, realizada na Catedral da Sé, em São Paulo, em 31 de outubro de 1975. O evento, que reuniu cerca de 8 mil pessoas, transformou-se em um ato ecumênico histórico e desafiador. A celebração foi conduzida pelo arcebispo de São Paulo, o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, ao lado do então jovem Rabino Henry Sobel e do pastor presbiteriano Jaime Wright. O rabino Sobel, em um gesto corajoso de desafio à versão oficial e ao antissemitismo que marcava a repressão, recusou-se a enterrar Herzog na ala dos suicidas do cemitério judaico. A união de católicos, judeus e protestantes contra a opressão demonstrou uma força e um clamor por democracia que marcaram um ponto de inflexão na luta contra o regime.


​O legado de Vlado vive, hoje, no Instituto Vladimir Herzog (IVH), que é presidido por seu filho, Ivo Herzog. A entidade atua na defesa dos Direitos Humanos, da democracia, da liberdade de expressão e do direito à memória e à verdade, promovendo debates e o engajamento cívico. Para Ivo Herzog, a luta de seu pai e o impacto de sua morte são "uma forma de ensinar as pessoas" sobre a importância da reflexão e do diálogo na construção de uma sociedade democrática.


​A Luta Incansável de Clarice Herzog


​Nenhuma história de luta pela memória de Vladimir Herzog está completa sem mencionar a determinação inabalável de sua esposa, Clarice Herzog. Por anos, Clarice travou uma batalha judicial e pessoal contra o Estado brasileiro para provar a verdade sobre a morte de Vlado e responsabilizar os agentes da ditadura.


​O processo movido por Clarice, ainda nos anos 1970, foi pioneiro, e em 1978, a Justiça Federal reconheceu a responsabilidade do Estado pela prisão arbitrária, tortura e morte do jornalista.


​A incansável busca por justiça de Clarice Herzog, que a tornou uma heroína da resistência, é um símbolo da dor e da persistência de todas as famílias vítimas do terrorismo de Estado. Sua frase, "O que me dói é saber que eu estou pagando pensão para os assassinos do meu marido" (referindo-se às pensões das filhas de militares), resume o paradoxo da impunidade e a ferida aberta da Lei de Anistia de 1979. A luta por reparação, que incluiu o reconhecimento tardio de Clarice como anistiada política, demonstra que a justiça plena ainda é um objetivo a ser conquistado no Brasil, exigindo a investigação e punição dos crimes de lesa-humanidade, conforme sentenciado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2018.


​Cinquenta anos após seu brutal assassinato, Vladimir Herzog não é apenas uma vítima, mas um mártir cuja morte se tornou um catalisador para a redemocratização. Sua memória continua a ecoar, lembrando-nos que a democracia é uma conquista diária que exige vigilância, verdade e justiça.



Gilson Romanelli

Jornalista

 
 
 

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